quarta-feira, maio 30

"Um homem de muita categoria"


“Um homem de muita categoria”, foram as palavras proferidas pela senhora de Jardim Gonçalves, à saída do Palácio da Bolsa no Porto, onde decorreu a Assembleia-Geral do BCP, desta vez o alvo da atenção da esmagadora maioria dos meios de comunicação social.
Não sei se Jardim Gonçalves é ou não um homem de muita categoria, até porque essa consideração é sempre muito subjectiva, dependendo do ponto de vista do analista.
Jardim Gonçalves, foi sobretudo um grande estratega, um gestor com visão, que ganhou a confiança de um determinado número de investidores e que soube aproveitar a fase conjuntural económica favorável no nosso país, em que se entrava num período de estabilidade política e começavam a assomar aos nossos cofres avultadas somas de dinheiro provenientes do fundo social europeu. A economia revitalizou-se. Tornou-se viável a realização de muitos projectos. Abriam-se muitas contas bancárias e solicitavam-se financiamentos, escolhendo sempre a entidade bancária que melhores condições oferecia, em termos de encargos financeiros, da celeridade na resolução, da eficiência dos serviços. O BCP estava na primeira linha - uma vez que a banca encontrava-se praticamente toda nacionalizada - pelo modelo instituído de prestação de serviços, que traduzia um conceito inovador, inédito no sector bancário, de eficiência e modernidade.
Depois de conquistado o mercado e consolidado o seu nome junto da banca nacional, seguiu-se a fase da expansão no mercado interno. Triagem de clientes, aquisição compulsiva de entidades bancárias mais vulneráveis, com o consequente despedimento em massa dos seus funcionários mediante chorudas indemnizações, abertura de inúmeros balcões, renovação da imagem dos existentes, enfim, jorrava dinheiro a rodos. Apesar dos avultados vencimentos pagos aos quadros superiores do grupo, juntamente com um conjunto de regalias mais próximo da ficção do que da realidade, tendo em conta a tabela salarial praticada na função pública e no sector privado em geral, para as mesmas categorias profissionais, o banco apresentava sempre lucros elevadíssimos.
Seguidamente vem a fase da internacionalização que ainda decorre. Esta, foi a vez de o poder político, nomeadamente dos governantes, lhe tirar o tapete. O modo proteccionista que vinha sendo exercido e que favorecia aquela entidade bancária, revelou-se quando o grupo Santarder pretendeu adquirir a totalidade do capital/acções do grupo Champalimaud, em que houve que dividir o bolo em fatias iguais, entre estes dois grandes grupos. Mas, o fenómeno da globalização, acrescido da perda do poder de decisão dos governos dos estados que integram a União Europeia, foi permitindo que a banca estrangeira se instalasse em Portugal, e o mercado já desde si pequeno acabou por ter que ser dividido entre estas várias instâncias económicas, gerando um grau de concorrência que culminou, no caso do BCP, com o encerramento de muitas agências, a rentabilização dos postos de trabalho e a abertura a uma franja de clientes, cuja entrada tinha sido até ali vedada, através dos requisitos exigidos para abertura de conta.
O BCP é actualmente uma entidade bancária fragilizada, e uma blindagem de estatutos, que anteriormente permitiria reduzir a voracidade com que os grandes grupos económicos absorvem os mais pequenos, em vez de ser uma solução para afastar os “invasores”, é hoje, antes de mais, um caminho para a estagnação que culmina com a consequente perda de projecção no teatro de operações das grandes áreas económicas.
Joe Berardo tem razão. Jardim Gonçalves devia reformar-se definitivamente, deixando, assim, o caminho livre a uma nova geração de gestores que possam trazer a mais-valia necessária a este “projecto bancário”, não através da concentração, mas de uma difusão estruturalmente planificada em que deva assentar a futura trajectória da sua acção.

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